domingo, 28 de março de 2010

Nada além do negro.


Você tenta fugir da dor e da tristeza. Mas aquelas mãos, com seus dedos longos e magros como garras te puxam para o negro.

Nada além do negro.

E você acaba caindo em um lago de águas escuras. E vai afundando cada vez mais na escuridão e no frio. Tenta encontrar o caminho de volta, mas não consegue enxergar nada...

Nada além do negro.

E você continua caminhando por ruas sem nomes, vendo rostos sem faces. Apenas borrões onde deveriam estar às expressões de felicidade, de pesar, de dor. De qualquer sentimento que o valha. Então você tenta procurar em seus corações, mas lá não há nada...

Nada além do negro.

E assim nós caminhamos. Tentando ouvir a melodia tocada por cada gota de chuva. Cada nota que caí do céu. Ouvindo cada história que é contada quando uma folha seca se desgruda de seu galho. Mas o som que mais se propaga no silêncio é o estilhaçar das promessas quebradas e dos corações partidos. Os sons que precedem o silêncio sinistro do negro.

Nada além do negro.

Ninguém sabe ao certo de onde vem o negro. Ou o porquê dele vir. Mas quando ele aparece, a luz se esconde. Os sons desaparecem. E assim ficamos surdos e mudos. Nada se houve nada se fala...

Nada além do negro.

Filho Pródigo.



Eu olho para o horizonte e não sei dizer se estou indo ou vindo. Se o que vejo é o passado ou o futuro que se aproxima.
As vezes que matei. Que morri. Não me dizem nada, não consigo distinguir a lágrima da dor da lágrima da alegria.
Foi se o tempo em que as respostas eram sopradas pelo vento. Hoje vejo as pessoas matando e morrendo, sem saber os motivos.
Aquele abraço acarinhado eu não tenho mais. Não recebo mais o amor de outrora. Foi-se o sentimento de alegria do olhar que tantas vezes eu procurava... Que hoje acho que nunca encontrei.
Andamos sob o mesmo sol, a mesma lua. Mas nos achamos dignos de acabar com o outro. Não somos mais iguais?
O que acabou com os meus sonhos?
Com as minhas realizações?
O medo de seguir adiante? Ou o destino que não foi traçado como deveria? Não sei...
A única coisa que é certa é que não escaparei das mãos do destino que me levarão à morte... Um dia.
Morte... Uma palavra tão pequena para algo que é tão imenso... O que nos espera além do toque frio do ceifador? Do sorriso congelado no rosto cadavérico da morte?
Divagações novamente. É a única coisa que minha mente cansada consegue fazer. Pensar no que eu vi; no que senti; no que ainda vai acontecer...
As melodias que compus hoje me soam tão distantes. Cada nota tocada me contava uma história de um mundo em que eu sabia se estava caminhando para frente ou para trás. Um mundo que hoje não existe mais... E eu nem sequer sei a causa de seu fim.
Aqueles esqueletos escondidos nos armários querem mesmo dizer um segredo? O que eu escondo de mim mesmo?
Apenas divagações... Apenas grãos pequenos de areia que se perdem em uma imensa praia de pensamentos. Noções vagas do ser que eu fui, que eu ainda me transformarei através de uma metamorfose sinistra que sugara as minhas forças e me deixará velho... Novamente.
Uma criança corre, sem medo, sua coragem é reconfortante. O que ela espera? O que ela sente correndo assim tão livremente? Tão segura de si... Desistirá ela quando tropeçar na primeira pedra no caminho?
Os amores que eu vivi...
Os que nunca aceitei...
Os que me fizeram bem... Mal...
Onde andam eles? Perdidos? A salvo em uma redoma de vidro? Protegidos pelo tempo que corrói e que amarga a doçura dos dias de ouro?
Ouro... Será que algo que reluz tanto é realmente tão precioso? Conseguirei comprar toda alegria, amor, felicidade ou qualquer outro sentimento bom com algumas pepitas de ouro? Não... Essas coisas estão perdidas há anos. Tão perdidas quanto à luz das estrelas que ainda chegam a nós, mas que suas verdadeiras donas já se extinguiram há séculos.
Séculos... Todos os que se passaram. Todos aqueles que ainda passarão... Me fazem pensar... Quantos mais viverei? Quantos outros irei morrer novamente?
Viver... Uma palavra tão bonita para algo tão complexo. O que é o viver? Se a única certeza da vida como já disse... São as terríveis e gélidas mãos do destino. As mesmas que te tiraram todos aqueles que você ama, que você se preocupa...
Não, não importa o quão forte você está. A vida, nada mais bate tão forte quanto a vida. Você tem que apanhar, e aprender suportar toda a dor que a vida lhe dá...
Pois dos momentos de dor, é que tiramos as forças para procurar os momentos de alegria. São esses momentos terríveis que nos fazem procurar a felicidade como um esfomeado...
As horas passam, mas com a chegada da aurora elas parecem voltar. Junto com o tempo que se passa ao contrário minhas rugas começam a sumir. Minha juventude vai voltando e eu sinto a força em meu corpo.
A vida assim segue, com os seus altos e baixos.
Continuo dançando no telhado, seguindo o ritmo da música que nunca consegui ouvir. Mas mantendo sempre o compasso para não despencar...
A única coisa certa... As mãos... E todas aquelas escolhas que eu fiz. Delas... Talvez me arrependa apenas das quais eu disse não.
Talvez...